quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Monólogos matinais

 Parece que quero expressar algo mas não sei o que é. Será que tudo o que a gente escreve se torna realidade? Se a gente imagina, se a gente pensa, aquilo é real, mesmo que não pareça. É material na medida em que a realidade é etérea e volátil. Como tocar a realidade? Os sentidos nos enganam, o que é doce para mim pode ser azedo para outra pessoa. Então o que é real para mim pode não ser para outra pessoa? A gente se prende em celas imaginárias, e isso nos imobiliza como se as grades fossem materiais de fato. Uma prisão interna que nos deixa imóveis, sem poder de ação. Como se a prisão nos desse alguma segurança. E quando nos obrigam a quebrar as grades? È liberdade compulsória. Somos reféns da nossa liberdade. Quero enxergar as grades que me limitam. 

Não preciso escrever ou pensar grandes verdades. Escrever é uma meditação. Na escrita foco meu fluxo e percebo sua regulação, meus pensamentos indômitos tomando forma, mas um após o outro, feito uma fila indiana, uma sequencia, uma série. Os pensamentos abstratos se equilibram numa salinha de espera com chão liso e um buraco numa das paredes, se eles se agitam muito podem cair no túnel do esquecimento, onde há uma bifurcação que pode devolvê-los à salinha de espera, ou levá-los para o limbo do um dia talvez. E eu os observo. Já me acostumei bastante a esquecer de vez em quando, mas a prática costuma deixá-los mais calmos e serenos enquanto esperam a minha mão lenta e o meu corpo os colocarem para fora de mim. Isso aqui não seria também uma realidade estendida do que sou? Essas linhas fazem parte de mim. Será que quem inventou a escrita sabia do seu poder eternizante? 

A humanidade é um grande organismo. A comunicação são as sinapses. Como posso pensar que sou sozinha? Sou parte de outras pessoas, sou tudo o que me rodeia. Me movo neste corpo mas não sou este corpo. Sou além. Posso estar muito além. Se a gente não consegue conhecer tudo ao mesmo tempo, deve ter um bom motivo pra isso. Hierarquias. É ruim sentir-se inferior, mas suspeito que isso seja um delírio humano - melhores, piores - como um ser que habita um corpo humano pode ser pior que o outro? Só o fato dele pilotar essa máquina-corpo já revela uma inteligência cósmica e espiritual grande, no mínimo. Como é que alguém habita um corpo? Nosso pensamento cristão também colocou grades no nosso viver, na forma com que nos relacionamos com o mundo. Nos limitamos ao que é "certo" ou "errado" sob uma perspectiva moral e julgamos as pessoas sob essa mesma perspectiva. Eu julgo. Me julgo o tempo todo. Como se houvesse uma régua que achatasse nossas possibilidades de ser.

sábado, 22 de agosto de 2020

Ruídos

 Me interesso por palavras, pelas sutilezas que cada uma delas carrega. A pessoa que as lê ou escuta só pode se relacionar com elas no limite da sua própria vivência. Isso é tão incrível e, ao mesmo tempo, perigoso! As pessoas podem se desentender ao falarem umas com as outras, mas o silêncio também pode ter vários sentidos. A verdade sobre o silêncio só se revela quando ele é quebrado. Ainda assim, isso não quer dizer que o silêncio em si seja algo falso, pelo contrário. Nele há tantas verdades possíveis que apenas isso já seria suficiente para justificar a manutenção de um eterno silêncio. Uma eterna não-explicação  de nada. Nada precisaria ser explicado, tudo estaria dado. O silêncio, por ser tão polissêmico, pode ser a única resposta possível para todas as perguntas. 

sábado, 15 de agosto de 2020

 Uma garrafa

anzol

no mar virtual