segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

A linha que conecta os absurdos 
Pode ser tão ou mais lúcida que a própria incerteza.

Vou assim através da palavra mapeando a sensação

E percebo que tudo se encaixa

Foi sem querer.

Sumiço II

Sou só eu, esse ser indigno de descrição

Imprevisível, inescrutável, amorfa mutante rasteira medrosa

Olho de canto e profundamente, o âmago da vida mesma dentro de cada impossível ser-outro

A outra o outro es outres todes calades e assustades pensando meu deus o que essa cabeça está pensando ou pouco se lixando pra minhas possíveis opiniões

Prefiro assim passar despercebida

E só passar por notável quando me convém

Não seria lindo assim, seria insuportável

O que me encanta é o talvez encanto, talvez reveses, talvez te odeio

O que me encanta é não precisar

Fingir

Lutar

Pra encampar um espaço lote na esquina de um pensamento

Re-existir sem forças e sem hábito

Sumir da minha própria vista cansada.



Esconderijo

Meu roteiro me envolve e escrevo pra fora de mim, aquela plateia amorfa que não está nem aí
Elas me leem e esquecem que existo no instante antes de terminar a última palavra
Será que eu queria ser lembrada? 
De que vale a lembrança alheia se eu de mim mesma nunca tirei nada de bom?
Anunciar a queda e esperar os aplausos ruidosos, antes ameaça e nunca resolução
A constante armação da fuga, germinar destroços, gerir a escuridão
Esqueço, me permito, mas por momentos muitos curtos, aproveitar a existência e dançar a vida
Apenas amostras grátis de eternidade
Olhar um passarinho na janela e me emocionar
Ouvir um choro e chorar
Abrir a boca e cantar
Só nesses momentos me escuto e me entendo
Lembro que tudo existe e nada
Que o tempo é ilusão
Que fujo da enormidade da vida por sabe-se lá que motivo
Não queria mais fugir.

Busca

Entendo como inquietude o monstro que me habita

Devorando presenças sempre que me exijo demais estar

Nunca posso estar tanto quanto quero

Sempre estou distante

Em busca do próximo passo, do passado momento, em busca de algo

Estou sempre buscando

Deixando a vida pra depois.

sábado, 19 de novembro de 2022

Desaparecências e suas similitudes com o esquecimento

Esquecimentos e suas amplitudes

Ambivalências e silêncios


Uma redundância que dói

Uma dor que fragiliza

Uma fragilidade que agita

Uma agitação que sensibiliza

Uma sensibilidade promíscua

Uma promiscuidade que excita

Um tesão que ocupa

Uma ocupação que esvazia

Um vazio que redunda

Olhar para a imagem e não ver nada além de memorial

Memorial da retina - uma imagem vale mais que mil silêncios

Silêncio, a memória está descobrindo um passado novo


terça-feira, 30 de agosto de 2022

Agonia III - Sereia

Tinha outra que era mexer o cabelo na piscina

E brincar que ele era uma sereia

Ou era eu? 

Quem seria?

Nesse caso, a agonia

Era sair da água e matar a coitadinha


Agonia II

Também tinha uma agonia

Que era imaginar uma agulha bem fininha

Um fiozinho quase invisível

Furando uma bola gigante

Os contrastes me admiravam

Agonia I

Quando era criança

Brincava de tédio

Olhava pro céu

E via nuvem preguiçosa

Imaginava estar lá em cima

Bem pequenininha

No meio das nuvens gigantes

Eu minúscula

Brincava de agonia


Fruta

Olha o tamanho desse cérebro

Parece uma laranja gigante

Mas não cabe nada que não seja

Imaginante

Agonia 0

Ninguém acredita no vazio

O vazio está incrédulo

Cheio de crenças ridículas

Escrevo para acreditar no que vivo

Em tudo posso ver poesia

Até no que não acredito

Releitura

Um rascunho

Algo que ficou guardado

Amassado no fundo da gaveta

Que volta à vida para ter seu encantamento

Pelos olhos de quem admira 

Tudo o que não sai de um papel


segunda-feira, 22 de agosto de 2022

Abraço

Quase um formigamento

A certeza de estar certa nesse momento.

Traço

Deixar a leveza me consumir em pedaços

Aos trancos barrancos me empurrar do penhasco

Sou fera ligeira saboto todos os passos

Entregue e presa aos teus possíveis abraços


Procuro nos olhos me despedir dos destroços 

Que dias de chuva desperdiçaram sem rastros

Murchando as flores dos destemidos negócios

De cântaros mágicos e disponíveis acasos


Sou planta rasteira farejo todos os ossos

Dos pântanos beira o invisível remorso

De tanta sujeira vai espalhando os caroços

De um mundo inteiro contrariando os esforços


Sou pedra, parada, festejo todos os ócios

Sem  ti não sou nada além de tudo no espaço

No afã de esquecer celebro cada estilhaço

De tudo o que temos e sobra só o bagaço





Espaço

Me reapaixonar pelas versões que cavo de mim mesma

Sentir novamente a vida dilacerando o sentido, não me deixa olhar pra trás

Acabo de renascer, já morro novamente

Mergulhada no tudo, a culpa, o caos, a confissão

Evapora, será que sempre fui eu mesma meu grande amor?

Estou fadada a cair por mim, em mim, sempre só

Fugindo de me perder daquilo que mais amo

Minha solidão


O conforto de não cumprir

O conforto de não caber

O conforto de suprir

As minhas próprias expectativas inatingíveis

Só eu mesma grande rainha

Da grande poesia da minha vida inteira

Por nada me trocaria

Por nada me deixaria

Jamais não me escolheria


Me quero e abuso da minha compaixão inconsumível

Nada é possível compatível tangível

Não posso, não deixo, nada mais vai entrar

Aqui me permaneço e esqueço

Que outro espaço não há


Cercada, nada será mais seguro

Que este meu próprio lar.









quarta-feira, 6 de julho de 2022

Sentidos

Se agarra no sentido que ela mesma inventa

O tempo todo pra se divertir

Pra se achar útil, pelo menos

Pra não achar que perde o tempo dos outros

Pra não se achar esquecível, no mínimo


E pensa que lá, do outro lado

Tem um espelho refletindo o que nunca se pode ver

O espelho do avesso pensado igual

Do contrário do que um dia

Imita a vida ela mesma no outro canto

Sumidouro, sumindo

Que é aí que o espelho faz sentido


No contrário, no avesso

No inverso inventado da cabeça

Lá dentro, ou lá fora

Por que o espelho é tudo e todo lugar

Ao mesmo tempo


Ela também imita a vida

Procurando 

Sentido


Memórias

Engolir a tua angústia

Beijar tua memória

De novo

Até virar um deserto de infundezas

Milhares

Tem vezes que esqueço quem sou

Perdida entre tantas milhares que me exigem ser

Que não dou conta nem de uma, quiçá mil

Mas que, no fundo, também quero ser

Todas as mil

E uma, se puder


Quase sempre meu querer não tem limite



sexta-feira, 17 de junho de 2022

O que seria a poesia

A quebra entre o que pode me machucar

E o que só finge que me cutuca.



Biblioteca

Nada pode ser infinito

Você acaba de ler todos os livros que leria numa vida, um dia.

Cometas tipo 1

Pretos cometas na sombra da testa

E o sorriso inverte o que os olhos provocam

Provoca provoca

Vai ver se eu não explodo na esquina.

Frugal

Olha com dois frutos bem pretos por trás da minha nuca

Deslizando a vontade pra depois da morte


Eu olho com fome pra comer o teu campo magnético todo

Comendo o teu corpo e digerindo na retina

Já sou o teu trejeito sério direto

Já sou fruta dentro de você

Passeando pelos dutos linfas veias 

Olhando tudo com atenção pra guardar no que invento

Um rápido documentário da nossa curta saga desaparecida

Real demais para ser esquecida

Vou continuar te comendo pra sempre

Até morrer de fome.



Uma pena

Nada mais importa

E que eu desapareça pelos buracos

Sumindo enquanto converso com as diversas projeções que espalho

Esboçando um universo autêntico

Louco, a loucura sempre romântica

Que não experimenta entender o que já escapou


Intimidade pública, eu sou uma autoridade explícita

Máxima capacidade de mentir o tempo todo que me importo

De parecer até pra quem não me sabe uma sumidade súbita 

Logo ela, logo ali

Com o olhar vago fingindo que não permite que tudo lhe atravesse

Como raios de estrelas cadentes furando a pele e o espírito

Transparecendo uma inteireza tão caída que amolece


O silêncio da madrugada como escudo

Pra não dormir com o barulho dos pensamentos cada vez mais agudos

Estarrecedor

Estou só com o tempo, que me acompanha no rosto muito de perto

Baforeja no meu pescoço e me enforca

A música que é senhora das minhas rugas e meus tormentos

Deve ser isso, virar fumaça

Se despedaçar o tempo todo

Ficar pelo caminho sem controle

Ensurdecer pois está tudo tão abafado

E é quente dentro do ouvido

Tem algodão, tenho certeza.


A tua leveza é tão sobrenatural

Você parece uma pena.



quarta-feira, 15 de junho de 2022

Domingo

De repente uma coisa fina tão sutil 

Pois não era uma mensagem

Sempre foi o vão que habitava nosso espaço

Pra você poder ter sua razão

Seu sofrimento, escrito e derramado em imagens miraculosas

Amuletos, galhos, gatos pretos

Uma colagem dos teus estilhaços

Dos quais sou só um troço

Um pedaço

Que sobra aos domingos pois é o dia mais triste.

A cidade inteira

Desde que eu gritei "não" e você gritou "NÃO"

Mais alto ainda

Bem sonoro pra toda cidade ouvir

Pra mostrar que o seu grito já estava lá 

Bem antes do meu

Parei no eco do berro

Ouvindo as tuas vozes repetindo não não não não

E gritando ainda mais agudo Não MESMO

Pra ouvirem além do teu 

Tudo o que era verdade na minha negação

Que você calou com nãos severos nãos

Incisivos, finais, conclusivos

Nãos mais fechados que abertos

Como se um não pudesse ter uma abertura uma passagem um portal

Pra o que quer que houvesse do outro lado

Um não mais colorido

Que meu ouvido captasse e quisesse interpretar

Um não talvez um talvez

Que não seja tão não que não se possa remendar


Mas ouvi ainda mais alto um não trepidar no céu do inverno

Cada vez que lançava meus todos nãos na possível visão que fazia da tua certeza tão precisa

Na espera da resposta ainda mais esgarçada de boca aberta que é mais um gigantesco NÃO sobre o parque inteiro

Nãos pichados na calçada no muro no mercado

Você colava cartazes cada vez maiores de não

Espalhava papeis pela noite caindo sereno frio e não

Eu gritava em intervalos curtos nã nã nã nã não jamais

Eu arrancava de mim os nãos que fiquei de te dar

De mãos beijadas nãos toma tudo fica com você

Assim ficamos quites e podemos seguir negando

Apostando

Pra ver quem grita mais alto 

Em silêncio

domingo, 12 de junho de 2022

Atenção

Não me encontro onde me perdi

Ali já não estaria jamais novamente nem que insistisse

Não sou um gato


Te ver revela o mistério

E me dá mais angústia ainda

Não querer e não querer te ver

Querer não querer te ver 

As vozes, a adolescente que grita e esperneia

Quer atenção

Quer ser compreendida

Ela só quer

Atenção


Ela quer bajulação

Que seja amada

Como ninguém poderia

Ninguém é capaz de lhe dar tanto amor


Ela faz falta 

Nela mesma

Ela some

Nela mesma

Ela desaparece e volta a aparecer na vida adulta

Ela nunca sumiu

Nunca foi embora


Ela está ali

Você, desapareceu


Aparece através de outros prismas

De outros olhares

Aparece no labirinto de palavras e histórias com objetos

E tento te reconstruir dentro de mim

Dia após dia

Tento te refazer

Traçar teu trajeto

Estar em tuas horas

Presente

Pensante

Te desenho com minha memória

E não esqueço, não consigo

Te desejo pois desejo a mim mesma

Refaço nosso caminho

Nossa pequena tragédia cômica - era uma piada de mau gosto?

Rimos de nós mesmos e depois choramos

Como crianças histéricas que depois de um ataque de risos ficam incontroláveis

Gatilhos

Lembranças

Sentimentos

Tudo misturado na exatidão de haver perdido o nosso tempo

A culpa já não é quem me assombra

É a tua própria sombra me cutucando e me dizendo pra parar de te seguir


Não venha atrás de mim

Não me procure

Me deixe lamber minhas feridas


Tudo novo, e sempre é

Tão fresco novo surpreendente

O que você queria, afinal?


Você teve que me falar

Aquelas coisas todas que também doeram em você

Mas mais em mim

Sem dúvidas, mais em mim

Porque sou assim dramática

E tudo toma uma proporção gigantesca

Que toda a tua razão derrete por dentro de mim como um ácido quente

Me destrói e limita


Quanto mais me vejo, mais pressinto

Que crio e destruo pelo prazer de ver queimar

Porque nada teria o direito de existir além de mim

Tamanha a vontade de controlar o que me escapa

Tamanha posse do mundo, tamanho rancor

Que inexisto se não souber que sofro por nada

Pra caber nos vazios que me preenchem

Não faço sentido


Não te vi, olhei pra mim

Pensei que uma coisa que me faz sofrer tanto não merece que eu me arraste por baixo da terra

Já basta meus pés cansados

Já basta o silêncio que pesa 

Já basta o tapa na cara que é não existir


Me faço sentir pelo olhar distante 

Que talvez nunca exista

Insisto na imensidão do mar como a cura para os males todos

Ou a desculpa que falta pra me abster do impossível.


quarta-feira, 4 de maio de 2022

Extenuar

 Acordo de madrugada e nada mais faz sentido se não escrever

Sinto que silencio a mente quando provoco as palavras

Elas saem e algo dentro de mim se destrói

Pra talvez voltar com outros nomes, mas ir embora também

Desfazer-se delas mesmas, as palavras fogem aos sentidos

Alcançando algo que elas não trazem já na sua essência - a vida gigante que as ultrapassa

Sem palavras, volto à vida, ela mesma

Sendo algo inexplicável e incoerente

Pois nada supera o silêncio da existência em si mesma


Atendo às minhas próprias exigências

Sempre com muita razão, muito zelo

Cuidando de cada passo, tentando ser sempre mais para os outros

Menos para mim

Que sou algoz forte com cara de anjo

Uma angelicidade infinita

Um eterno - você é o que quer - dentro do que eu queira - e do que os outros esperam?

Amarrar-me a mim mesma

Novamente, pelo calcanhar

Que é mais difícil de alcançar, de qualquer forma


Nada mais me observa, por sorte 

Já estou só nas palavras, após tantos anos

Finalmente, uma intimidade própria

Um descompromisso sincero, até onde caiba

Pois depois que eu for nada mais importa

E qualquer um pode dizer o que quiser com elas

Ou com o que elas já significaram um dia


Tudo morre

Pra onde vamos, depois? 

Talvez para uma lembrança infinita de tudo

Ou um esquecimento total e abissal

Onde nem sequer se sabe que se esqueceu

Como agora

Pois me sinto esquecida, sempre atrás do que sou

Ou do que quero ser

Desejo

Impulso

Pulsão

A vida ela inteira

Quero sentir no corpo

O tempo 

A alma

Tudo junto


Não perder nem um gole da vida mesma

Sorver até o fim

Viver para tomar

Deliberadamente, beber

Chupar, extenuar a vida toda

Queimar e arder

Enquanto isso, viver


quinta-feira, 31 de março de 2022

 E pequenas frases jogadas ao mar não mais chegam aos destinatários

Porque é assim e sempre foi que me prefiro

Nunca antes vista

Nunca antes lembrada

Porque é tudo uma loucura e não quero viver sendo esquecida como louca

Então prefiro não ser lembrada nem esquecida

Apenas, sida

 Esqueci de você até segunda ordem

Me reencontro com as sombras aquelas todas que nunca quero despedir

Me despeço do som que ecoa da saudade

A saudade que não existe

A saudade que resistiu ao fim dos tempos

A saudade que é a própria existência


Sigo seguindo os fios cor-de-rosa embolados dentro da cabeça

às vezes nós

às vezes mesmos fios

Por dentro só tinta de uma vontade de ser fios

Por fora só palavras e sentido


Tudo faz sentido e nada mais

Quero sumir de você

Quero sumir de nós

Que nada nunca existiu

Porque é sempre mais fácil fugir

E imaginar que eu nunca existi na nossa história


Mas que sombras tão obtusas

São elas

Que remediam toda dor

E causam todo desconforto

Absolutamente enclausurado na memória partida de tantas eus

Absolutas e obsoletas, todas juntas

Mas, não menos que elas, torpes

Esparsas, amarelas

São todas quem foram

Belas, jovens, soberbas e sábias de tudo

E sós

Sempre muito sós


Como sempre estou por vontade própria

Porque a mim mesma não ofereço perigo

Mais do que me aturar, e isso já é grande esforço


Me deparar com várias absolutas

Sempre absolutas e esquecidas dos outros

Imprecisas de diretrizes alheias

Não precisam de mais nada


Variam entre a preguiça e o desgosto

E as palavras me esquecem, finalmente, me esgotam


Eu esqueço que me prefiro sempre maior

Maior do que todas as outras

Esquecida da minha pequenez

Esqueço de não ser


Reencontro o cinismo de me esquecer

Sempre esquecer

Porque lembrar é sempre duro e original

E cansei de não me encontrar nas outras pessoas que sou