sábado, 31 de maio de 2025

Plateia

Adoro o silêncio das atitudes implícitas
Das grandes ou pequenas negações
Das inversões majestosas da certeza
De jogos que prefiro não ganhar

Gosto de observar
Me emociono um pouco, quando vejo
Com clareza contida e genuína
A cena impecável
A insegurança triste
O pequeno rito, comer sua dor
 
Acho bonito, não vou negar

O aplauso que dou é não estar nem aí
Nem aqui, prefiro mesmo não estar em qualquer lugar
Dessa plateia abobalhada e ruidosa
Saio bem antes pra não ver o ator tropeçar

quinta-feira, 22 de maio de 2025

Não tenho bordas

Assumo o risco de perder o controle

E me preciso em paz

segunda-feira, 19 de maio de 2025

Sono

A escolha como navalha da vida nela navego sem saber para onde apontar pois sempre estou com perspectiva deslocada - me olho ao mesmo tempo em que me sou e isso não pode ser natural. É natural saber do corpo muito pouco o que produzo líquidos febres inflamações pequenas ou grandes dores. Meu corpo me identifica no tempo no espaço e no entanto estou tão fora de mim como para me parir de novo a cada instante músculos ossos estou me criando. A terra quer me comer e eu me como sabendo que sou um amontoado de células condensadas ordenadas desordenadamente de forma a que sempre dá mais ou menos certo e meu olho não é meu corpo todo. Meu corpo não é minha cabeça mas acho que sempre estou morando dentro dela sendo meu corpo resto o que me carrega por aí e meu pé não pensa. Eu penso com a cabeça e ela não mora no meu pé. Mas meu pé responde a tudo o que minha cabeça dele recebe ou seja eu nem sou tão humana mesmo sou uma teia. A aranha que me faz sou eu que invento mas ainda assim quando durmo não sei mesmo se estou viva não tenho essa certeza. Se não estou acordada quando durmo quer dizer que morri e esqueci porque me entreguei tanto ao sono que ele pode me carregar para onde quiser. Eu quero dormir mais do que tudo pois lá não preciso pagar contas. Mas acordada me lembro de tudo apesar de quase nada mas ainda assim a dureza me faz encontrar uma pequena fresta de saída para a luz do que não consigo decifrar. A cada instante busco o facho que dela chega mas sabendo que se olhar por muito tempo talvez eu nem consiga mais fechar o olho e meu olho não pensa. Quem pensa sou algo que acha que pensa mas no fundo só existo como uma situação coincidente. Que coincidência, existir assim! A melhor explicação que poderia ter é o mistério mas ainda assim sou teimosa quero provar um pouco do mel ganancioso da sabedoria eterna do ofuscar de uma roupa que um dia não vou mais vestir porque quando pensei já não sou mais. Vivo assim me escapando pelo labirinto do total desconhecido e isso sim é uma delícia, me perder mais do que tudo não saber mais do que nada. Preciso dormir. 

Espectro

Chamar, assim, em voz alta

Os fantasmas que o silêncio anuncia

Estampar na noite uma dúvida 

De não saber definir contornos


Sozinha no alto do olho não me vejo 

Espelhada no que pode ser um “sim”

Também tenho minhas armas

Com meu exército interminável 

E os espectros de armaduras solenes

Apesar de não estar em guerra

Apesar de não morrer

Estou  sangrando 








quinta-feira, 8 de maio de 2025

Saco

Psicanalistas e o fetiche de ser ignorado
Os sonhos e a tradução do que o corpo cala
A hesitação e a culpa por trás da malícia
O crime de se deixar existir sem medo
O sono e a vontade de não acordar
A vida comida por um não-sei-o-quê de vontade suprema
Estou dentro desse mesmo saco
Mergulhada na farinha 

Desimportância

Na minha frente
A imagem do que não preciso
Um olhar perdido, incerto só na frieza de se exigir demais
"Tem pessoas que parecem vazias" - tem
Quem disse isso não fui eu, é só uma ideia, e você também é só uma ideia
Tive várias outro dia mesmo
Sempre tenho, o tempo todo

Hoje achei que estava sonhando
E alguém me sondava por detrás das árvores
Mas não tive medo, o céu estava azul e rosa e o caminho era sempre o mesmo
Viver morrendo que uma hora também vou ter que morrer
Não faz mal
Não me desimporto
Só preciso tirar uma foto, só uma
Do momento em que você achou que não me faria mal - se é que achou
E daquela flor bonita que me levou abduzida
Para um outro instante sem tempo