terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Fotografia - ou "O passado presente"

O vento que bagunça meu cabelo
O mesmo ar
Odores, ruas, luz do sol
São os mesmos de anos e vidas atrás
O resto dos dias ainda têm o mesmo êxtase sublime de minha infância
Minha infância inerte
Minha doce e curta - infância inerte

Me vivi como em dias frios, tremendo por cada músculo tenso, batendo dentes e esperando um verão descalço
Me vivi como num filme
Eu protagonista de um lugar, uma praça, uma água qualquer
Num instante eterno, o mesmo da foto, o mesmo de todos
Pois tudo lembra, menos a água
A água foi feita de esquecimento
E para o nada corre, como se corresse para o colo de si mesma

Não corro, pois não me sobra mais tempo
Um momento tenho, menos vida, no entanto
Nem segundos, nem dias - nada devolve minhas pequenas horas
Minhas vidas, imagens inversas, as calmas e descasos, os prantos e acasos
E em nada permito ver
Minha própria figura inventada
Frente a recortes e colagens
E um passado tão recente que me toca os ombros
Me embala e pressiona contra o muro
Me derruba
Me desgasta
E me liberta.

Sinopse

O que poderia dizer se sou apenas o aqui e o agora?
As palavras se perdem no espaço e no tempo como grãos de areia no mar, se dissolvem na imensidão que tentam descrever. Mal sabem que o infinito as contêm e que são partes do mecanismo de que acreditam ser o manual. Não existe manual para o universo, viemos ao mundo nus e com tênue idéia de que temos que alcançar alguma coisa, ideia que é tão inverossímil e distante que no percurso de seu alcance, quando estamos apenas começando a entender o caminho que trilhamos, geralmente somos obrigados a transcender.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Poema molhado

Gota
Gota
Gota
Gota

Pingo

Enxurrada

Inundação.

Gota
Gota
Gota

Pingo.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Felicidade

Minha tristeza é a mais feliz que há:

Afinal, não há alegria maior do que sentir-se vivo ao sofrer um desengano!

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Carnaval

Quero a calma que turva a superfície. Quero o sublime profundo e o alívio da tensão. O tenso, inaugurando o sentido, me cresce assim como uma flor.

Assim posso, com o passar dos anos, encontrar toda a paz de que necessito. Assim, meu Dionísio se encarna em palavras fundas e sinceras, em paz de esquecimentos e lembranças, em silêncios, em vãos. Em me encontrar encontro luz, em me doar encontro luz, em me saber me visto e, nus, os pensamentos me permitem. Cresço em símbolos, teia estranha de nervos e vícios e, sem pressa, cresço em cruz.

Divirto-me pois, ao contrário do que eu mesma possa achar. E minha liberdade não tem patrocínio.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Esforço repetitivo por ousar viver

Busco um sol que nasce
Em cada folha e em cada instante recortados pela escuridão.

A senhora me disse - senhora, porque em toda esquina te encontro comprometida com uma nova visão de mundo - que amar é como montar um quebra-cabeças: nunca sabemos o resultado de nossos esforços e sempre acabamos desmanchando tudo para tentar repetir a sensação de prazer que armar o inesperado nos dá. Dito assim, encaixando peça por peça, não soa tão grave quando admito que sempre procurei recriar meu mundo pelos cantos, já que as beiradas são sempre mais fáceis de construir, e que o processo de conclusão do meio acaba sempre ficando um tanto quanto nebuloso e perdido. O tempo que separa o instante em que faço caber a última peça e o momento de re-destruição de minha obra é infinitamente menor que aquele separando o fim das bordas e o começo do meio. Isso porque viver me dá pressa, quero chegar logo ao final para recomeçar.