Não vou dormir. Vou passar a noite escrevendo porque só assim me liberto de estar, só assim escapo de meus pensamentos. Só assim me verto.
Não vou dormir.
Sei que apagarei pela manhã, exausta de tanto fluxo, exaurida de palavras, exangue. Sei também que a calma me abalará. Me arrebata os sentidos sentir essa paz. Me doem os ouvidos. Me doem as palavras. É essa rua cheia de vazios - gritos, impulsos, ruídos - é essa vida.
Essa vida.
Se me fazem crer que há uma via de mãos dadas valendo cada segundo de existência, esquecem de me fazer crer que visto a pele de vida como cobra e troco a cada estação as meias furadas, que cresço em função do sol, e não da alvorada. Me visto, me troco, me sinto, me broto. Tudo em mim é esperança e medo - vazio e solidão - uma semi-reticência em botão. Copo cheio, as informações transpiram-se de mim sem receio, e eu fico assim, com tanta vergonha! No meio...
Pulo de estação:
aqui tudo é paz.
Beiro a estrada e me deixo à deriva nas curvas do sonho - sinto-me em tempos de Beethoven, quando usar peruca era algo tão normal quanto calçar sapatos. Aqui tudo é misterioso e as casas não têm corredores, mas sim quartos sucessivos e tão amplos que poderiam abrigar este apartamento inteiro. Beiro as ruas e tudo me lembra. Beiro as ruas e tudo. Beiro as ruas e...novamente em ostracismo - bens comuns são coisas do passado.
Só eu me li três vezes em três minutos - não me convenço de nada - e quem chegar até aqui ainda estará tão perdido quanto eu atravessando a Iguaçu vendada. Já falei de olhos, de móveis e labirintos e da manipulação de guarda-chuvas. Já falei e, até agora, a música que ouço é a rua. Um homem passa gritando, mulheres nuas cantando - faz frio. E sua nudez é íntima e vermelha. Como um verso. Como esta noite. Amém.
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